Mineralidade no vinho: termo técnico ou puro marketing?

O termo “mineralidade” tem se tornado cada vez mais comum no vocabulário de sommeliers e apreciadores de vinho. Embora seja frequentemente utilizado para descrever determinadas sensações na taça, ainda há debate sobre seu significado real e sua origem.

A palavra não aparece em obras clássicas da enologia, como O Gosto do Vinho, de Émile Peynaud, publicado em 1980. Mesmo assim, atualmente ela é amplamente usada para caracterizar vinhos que apresentam notas como pedra de isqueiro, concreto molhado, giz, petróleo ou salinidade — elementos que fogem da tradicional tríade fruta, flor e vegetal.

Para alguns especialistas, como os formados pelo programa French Wine Scholar (FWS), mineralidade é uma impressão sensorial complexa. Pode envolver aromas inorgânicos, texturas secas ou salinas e sensações táteis ligadas à acidez e ao corpo mais leve do vinho. Nesse contexto, ela não está necessariamente relacionada ao solo, mas sim a uma combinação de fatores químicos e gustativos.

Geólogos como Alex Maltman, da Universidade de Aberystwyth, no Reino Unido, questionam o uso do termo. Para ele, os minerais presentes no solo são absorvidos pelas plantas em forma de íons — substâncias sem sabor ou aroma. Maltman defende que a associação entre solo e gosto no vinho é mais simbólica do que real.

Em contrapartida, produtores que seguem práticas biodinâmicas acreditam que a intervenção mínima no vinhedo e a vitalidade do solo contribuem para uma expressão mais autêntica do terroir. Para viticultores como o austríaco Nikolaus Saahs, há, sim, uma ligação entre o ambiente do vinhedo e o perfil sensorial do vinho.

Pesquisas realizadas na França e na Espanha reforçam que a percepção de mineralidade pode ser explicada por processos bioquímicos que ocorrem durante a fermentação e envelhecimento do vinho. Fatores como o uso de leveduras naturais, fermentações espontâneas e contato prolongado com as borras (leveduras mortas) contribuem para o desenvolvimento dessas características.

Embora não haja consenso científico sobre a definição exata do termo, profissionais experientes continuam a utilizá-lo. O sommelier Guilherme Corrêa, por exemplo, relata encontrar ardósia nos Rieslings do Mosel, giz nos Chablis e sílica nos vinhos de Pouilly-Fumé — mesmo reconhecendo que a explicação técnica ainda é limitada.

A mineralidade, portanto, continua sendo um tema aberto à interpretação. Para uns, ela é resultado direto das decisões do produtor e dos processos de vinificação. Para outros, uma sensação real, mesmo que difícil de explicar. O fato é que ela se tornou uma ferramenta de linguagem que, certa ou não, ajuda a comunicar experiências sensoriais sutis e complexas do vinho.

Fonte – Mineralidade em Busca do elemento Perdido – André Lalas  Revista Gula 

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Quem Sou

Sou Etienne Carvalho, jornalista, sommelier formada pela ABSRS e pela FISAR, com qualificação nível 3 WSET. Atualmente, atuo como diretora e professora da ABS-DF e sigo me aprofundando no mundo do vinho como estudante de Enologia. Apaixonada por vinhos, viagens, leitura e escrita, criei este espaço para compartilhar minhas experiências e descobertas com quem, assim como eu, acredita que o conhecimento e a paixão tornam cada taça ainda mais especial.

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