Muitos fatores definem o estilo do vinho, no entanto, o clima tem um grande papel em sua expressão na taça. Por esse motivo, a maioria dos vinhos são produzidos dentro de uma zona isotérmica específica, considerada mais propícia para a viticultura, que de forma geral, se encontra entre os paralelos 30 ° e os 50 ° de latitude norte e sul. Mas isso você já sabe pois leu este post, certo?.
Isso ocorre porque o clima muda a fisiologia da videira e dependendo da exposição solar, da temperatura média, da amplitude térmica (variação de temperatura entre dia e noite), umidade, temperatura máxima no verão e mínima no inverno, uma mesma variedade de uva pode se expressar de forma completamente diferente em taça.
Se as notas de fruta em um vinho tinto tiverem um sabor muito maduro ou até mesmo opulento, é bem provável que seja de um clima quente. Agora, se o gosto for um pouco mais delicado como uma fruta recém colhida, o vinho provavelmente veio de um clima mais fresco.
E mesmo dentro dessas regiões, existem variações climáticas que são influenciadas por diversos fatores, como por exemplo, grandes massas de água, correntes marítimas (vide a fria corrente de Benguela na África do Sul ou até mesmo a quente corrente do Golfo em Bordeaux), altitude do terreno (como as montanhas de Trentino), umidade (como o clima marítimo de Bordeaux), padrões de vento (vide o Mistral no Rhône e o Cape Doctor na África do Sul), entre outras.
Vinhos de clima frio
Em regiões frias, a videira luta para que suas uvas amadureçam, o que faz com que elas permaneçam um longo período na videira, desenvolvendo diversos componentes de aroma, o que resulta em açúcares naturais mais baixos e maior acidez.
Estes vinhos podem ser descritos como elegantes e frescos. Sabores de frutas como cereja, framboesa e maçã verde são comuns, assim como notas herbáceas, pimenta preta (exemplo da Syrah de climas frios) e notas de chão florestal, como as encontradas em Pinot Noir da Borgonha.
No entanto, ao mesmo tempo que esse vinhos podem apresentar maturidade do sabor, em muitos casos, eles podem carecer de certa maturidade oriunda dos níveis de açúcar produzidos a partir de longa exposição ao sol.
Vamos pegar como exemplo a Cabernet Sauvignon, que pode se expressar de forma completamente diferente dependendo de onde foi cultivada. No clima frio e úmido de Bordeaux, muitas vezes ela mostra um caráter herbáceo, com frutas negras frescas e acidez mais alta. Quando oriunda do Napa Valley, região bem mais quente, ela perde as notas herbáceas, e adquire frutos negras maduras e apresenta acidez mais baixa.
Outras regiões frias bem conhecidas incluem Champagne, Trentino-Alto Adige da Itália, Mosel na Alemanha, Alsácia na França, litoral do Chile.
Alguns desafios do clima frio
Produtores em climas mais frios enfrentam desafios diversos. As videiras podem ser de menor rendimento, os invernos podem prejudicar ou matar as videiras e os eventos de geada são mais comuns e destrutivos.
Os produtores de Chablis, Borgonha e Bordeaux já sofreram perdas expressivas devido à geada na primavera. Além disso, se a estação de verão for muito curta ou fria, as uvas podem não amadurecer completamente com a colheita.
Por esse motivo, muitas regiões mais frias permitem a chaptalização (adição de açúcar ao mosto) para alcançar os níveis de álcool mínimos após a fermentação.
Outro ponto muito importante a ser levado em consideração é a quantidade de chuva da região, que pode ser propícia para doenças fúngicas ou fazer com que a videira absorva muita água diluindo os aromas e sabores da fruta. Tal situação deixa o vinho menos intenso e menos estruturado. Bordeaux, por ter um clima marítimo, enfrenta essa questão e, por esse motivo, os amantes de seus vinhos procuram adquirir os vinhos das melhores safras.
Vinhos de clima quente
Áreas quentes de cultivo e com mais exposição solar, permitem que as uvas amadureçam mais rapidamente e acumulem mais açúcar, o que resulta em níveis mais altos de álcool durante a fermentação.
Esses são vinhos são mais frutados, mais encorpados, com acidez mais baixa e volumes de álcool mais altos. Sabores de frutas mais escuras geralmente dominam como ameixas, mirtilos, amoras. Também é muito comum encontrar descrições de frutas maduras, geléia de frutas, frutas tropicais como abacaxi, manga, maracujá.
Neste caso, como a uva passa menos tempo na videira, ela acumula menos complexidade em seu perfil de aromas. As uvas são maduras, mas podem necessitar de mais profundidade de sabores.
As regiões do sul da França como Languedoc-Roussillon ou sul do Rhône, sul da Espanha, Austrália, Argentina, Califórnia, África do Sul são consideradas de clima quente.
Alguns vinhos conhecidos destas regiões são o Shiraz de Barossa Valley e o Cabernet Sauvignon de Coonawarra da Austrália, os vinhos do sul do Rhône na França, o Malbec Argentino e o Zinfandel da Califórnia.
Alguns desafios do clima quente
Produtores freqüentemente lutam para manter a acidez nas uvas e manter seus vinhos com sabor fresco, ao invés de cozidos ou flats. Na vinícola, medidas podem ser empregadas para ajudar, como a adição de ácido e até mesmo a redução dos níveis de álcool.
A exposição solar excessiva também pode provocar queimaduras nas uvas, fazendo com que as uvas desenvolvam sabores amargos. Por esse motivo, em muitas zonas quentes, o viticultor pode dispor e controlar as folhas da videira (em conjunto, são conhecidas como “canópia”), para proporcionar sombra suficiente caso de regiões extremamente ensolaradas.
Além disso, em regiões mais áridas, existe o risco de escassez de água, o que faz com que a videira interrompa o processo de condução da água das raízes para as folhas a fim de preservar os seus recursos. Durante períodos prolongados de escassez de água ou de seca, a fotossíntese é suspensa, as folhas murcham e as uvas não amadurecem, podendo matar a videira.
Busca do equilíbrio
Mas essas regras não são absolutas. Como já foi dito anteriormente, além do clima, existem diversos fatores que influenciam as características de um vinho.
As escolhas do viticultor e do enólogo são primordiais para determinar que tipo de vinho você terá na taça. Eles podem definir em qual local a videira será plantada, com mais ou menos altitude, maior ou menos exposição solar. Ademais, existem diversas técnicas de vinificação que influenciam diretamente nas características do vinho que será produzido. Portanto, as diferenças obtidas a partir do clima de onde o vinho foi produzido ficam cada vez mais difíceis de serem identificadas.
Outro ponto que deve ser levantando são os impactos das mudanças climáticas que estão ocorrendo nos últimos anos. A Borgonha é um grande exemplo disso. É uma região tradicionalmente fria, que permite a chaptalização por dificuldade de alcançar níveis de amadurecimento das suas uvas em todas as safras. Atualmente, essa dificuldade vem sendo superada tendo em vista os aumento da temperatura média da região.
Vale destacar também que apesar da divisão entre vinhos de clima quentes e frios, normalmente as melhores safras nas regiões frias são as dos anos quentes. As uvas alcançam tanto a maturidade de aromas quanto o amadurecimento. E o contrário, via de regra, também pode ser aplicado. As melhores safras nas regiões quentes são as dos anos mais frios, pois as uvas alcançam o amadurecimento e a maturidade de aromas juntos!
E para concluir vou fazer uso de uma citação do professor Harold Olmo, da Universidade da Califórnia em Davis, que afirma que na Europa a videira se agarra às bordas quentes de um continente frio e que, no Novo Mundo se agarra às margens frias de continentes quentes. Portanto, o segredo é encontrar o equilíbrio!