Degustação Inédita de Vinhos da Índia em Brasília

Giuliana Ansiliero (restaurante Dom Francisco) e os sommeliers Eugenio Cue (Del Maipo), Francisco Chaves (Porto a Porto), Leonildo Santana (Dom Francisco Asbac), Flávio (restaurante Bloco C e Lago) e Joaldo Lima (Dom Francisco 402 Sul)

A Enologia sempre surpreende. Não há dúvidas! Essa semana, por exemplo, tive o prazer de degustar quatro rótulos de vinhos indianos. Isso mesmo – vinhos produzidos na India! Reuni alguns sommeliers e enófilos donos de restaurantes aqui em Brasília para compartilharem a experiência comigo e, de  modo geral, adianto que foi surpreendente! Principalmente pelo fato de os participantes desconhecerem a Índia como produtora de Vinhos. Bem, nós degustamos um rótulo rosé e três tintos – dentre eles, o bastante popular em terras indianas: Sula Shiraz – Cabernet, produzido por uma das mais famosas vinícolas da Índia, a Sula Vineyard;  e um dos rótulos mais emblemáticos e premiados da Índia, o Sette, blend de Sangiovese e Cabernet Sauvignon feito pela vinícola Fratelli Wines, uma parceria ítalo-indiana que produz uma das gamas de vinhos mais premium da Índia.

Vou detalhar um pouco da nossa análise dos vinhos, mas antes, vou compartilhar o que aprendi sobre a vitivinicultura da Índia com vocês.

A produção de vinho na Índia começou aproximadamente 4.000 anos antes de Cristo, introduzida por comerciantes persas que trouxeram uvas para a região. Contudo, a viticultura ganhou impulso e se expandiu para o consumo local principalmente durante o período colonial, sob influência portuguesa e britânica. No entanto, ao final do século XIX, a praga filoxera, que ataca as raízes das videiras, também devastou os vinhedos de lá e pra piorar a situação, após a independência, movimentos religiosos promoveram leis de proibição do álcool, levando muitos estados a banir bebidas alcoólicas. Esse contexto desfavorável persistiu até cerca de 1980, quando, influenciada por padrões internacionais e o crescimento da classe média, a Índia experimentou um renascimento na produção vinícola.

Há muita  diversidade climática e de solos naquele país, mas algumas áreas oferecem condições ideais para a viticultura, especialmente em regiões montanhosas com grande variação de temperatura, ar fresco e proteção contra o vento. Regiões como Maharashtra, Karnataka e Tamil Nadu emergiram como centros vitivinícolas significativos, abrigando produtores renomados. Inclusive é em Maharashtra que está situada Nashik – conhecida como a Napa Valley indiana. Localizada a cerca de 180 quilômetros de Mumbai, Nashik beneficia-se de um clima propício ao cultivo de videiras, com invernos frios e verões secos, além de uma boa variação térmica entre o dia e a noite, o que é ideal para a maturação das uvas. A região tem uma topografia variada, com solos ricos e uma altitude que favorece a drenagem, contribuindo para a produção de vinhos de mais qualidade. Com investimentos contínuos em tecnologia, pesquisa e desenvolvimento, a região de Nashik está bem posicionada para continuar sua trajetória ascendente no mundo do vinho.

Bom, agora que vocês conheceram um pouquinho da realidade da produção de vinhos indianos, vou dividir com vocês as impressões gerais que tivemos ao degustar os vinhos da Índia.

The Source Grenache Rosé 2023 (produzido em Nashik) – Este vinho é um excelente exemplo do potencial da Índia para produzir vinhos rosados de qualidade, um segmento que tem ganhado popularidade entre consumidores tanto locais quanto internacionais. O vinho tem um estilo bem comercial, com uma cor que lembra os rosés da Provence, e um  perfil aromático que apresenta notas de frutas vermelhas frescas como morango, cereja e framboesa. Enfim, um típico “vinho de piscina”.  Possui uma boa acidez que oferece uma sensação de frescor ao açúcar residual que apresenta. Sem dúvidas, um vinho que seria facilmente aceito no mercado brasileiro. Esse vinho é bastante vendido na Índia. Sua versatilidade o torna perfeito para acompanhar uma ampla gama de comida, inclusive os codimentados pratos indianos. Vale ressaltar que é um vinho honesto e bem feito de Grenache com gosto de quero mais.

Fratelli Cabernet Franc e Shiraz – Algo que chamou muita atenção nesse vinho foi a expressão marcante de notas defumadas bem misturadas às frutas negras frescas. Notas vegetais e de especiarias também  foi algo notado quase que de forma unânime. Houve ainda percepção de um leve amargor no retrogosto. De modo geral, o vinho foi classificado como rústico, com acidez média e taninos moderados. A Fratelli Wines tem suas vinhas principalmente localizadas na região de Akluj, que fica a cerca de 170 quilômetros ao sul da cidade de Pune, em Maharashtra.

Sula Vineyards Shiraz Cabernet Sauvignon 2023 (produzido em Nashik) – Esse vinho lembrou muito os vinhos brasileiros elaborados com vitis labrusca, talvez por conta do alto açúcar residual. É um vinho simples, se muita complexidade, mas que apresenta no nariz e em boca notas de frutas em compota, lembrando goiabada e frutas negras e vermelhas mais maduras. Produzido pela Sula, uma das mais importantes vinícolas da Índia, certamente é um vinho bem comercial que tem por finalidade agradar pessoas que estão começando a conhecer o complexo universo enológico.

Sette Fratelli Sangiovese e Cabernet Sauvignon – O vinho Sette da Fratelli Wines é um dos rótulos mais emblemáticos e premiados da Índia e representa o auge da aspiração da vinícola em produzir vinhos de qualidade premium que possam competir no cenário internacional. Sem dúvidas, o vinho mais complexo entre todos degustados. No nariz mostra aromas primários, secundários e terciários ao mesclar notas herbáceas, picantes com toques de madeira. É um vinho “estiloso”, elaborado para pessoas que querem extrair uma experiência mais complexa durante a degustação. Um estilo que enaltece as notas deixadas pelo estágio em barrica, algo que agrada muito consumidor de vinho, inclusive no Brasil.

A Índia exporta seus vinhos para mais de 30 países. Infelizmente, no Brasil ainda não é possível encontrar vinhos indianos e todos os rótulos degustados foram trazidos diretamente da Índia para o Brasil na mala de um amigo. Detalhe importante – por questões religiosas e ou tributárias é muito comum na Índia a comercialização dos vinhos estarem restritas apenas a alguns estados, algo expressamente identificado nos rótulos dos vinhos. Saiba mais sobre a cultura indiana acessando @brazilembassyin.

Leia também – Chez France apresenta masterclass Crus de Beaujolais em Brasília

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Quem Sou

Sou jornalista especialista em vinhos e em comunicação digital. Sou sommelier Fisar e diretora da Associação Brasileira de Sommeliers do DF. Possuo qualificação Nível 3 (Wine Spirit Education Trust) e o Intermediário do ISG. Também tenho certificado em vinhos franceses (FWS) e vinhos californianos (CWAS).

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