Participei recentemente de uma degustação vertical do vinho português Pêra-Manca, promovida pela Associação Brasileira de Sommeliers de Brasília (ABS-Brasília). Para quem não sabe, degustação vertical é a degustação de vinhos do mesmo nome e marca, mas de safras diferentes. (Aconselho tanto iniciantes como iniciados no mundo do vinho que sempre participem de eventos como esse para perceberem como um mesmo vinho pode variar em aromas e sabores de um ano para o outro, às vezes, de forma radical).
O Pêra-Manca é um vinho da região do Alentejo. É um ícone português que mescla as uvas Aragonês (também conhecida como Tempranillo ou Tinta Roriz) e Trincadeira em sua composição na versão tinta. Na Idade Média, o Pêra-Manca já era conhecido e, segundo relatos históricos, foi esse o vinho trazido por Pedro Álvares Cabral quando descobriu o Brasil. No entanto, devido a praga da filoxera no início do século XX, a produção do vinho foi interrompida. Somente em 1990, ressurgiu em alto estilo quando a Fundação Eugênio de Almeida ganhou o direito de utilizar o nome Pêra-Manca no rótulo de seus melhores vinhos. De 1990 para cá, só foram produzidas 10 safras do vinho. Na degustação vertical, tive a oportunidade de degustar seis delas: 1998, 2001, 2003, 2005, 2007 e 2008.
Abaixo, de forma resumida, as minhas impressões:
Pêra-Manca 1998 – A cor granada com bordas alaranjadas denunciou a idade do vinho. No auge dos seus quase 15 anos, a bebida agradou menos do que o esperado pelos 14 degustadores da noite. As notas de ameixas pretas e frutas passas típicas do Pêra-Manca foram percebidas, mas na boca o vinho não surpreendeu, apesar de mostrar-se muito persistente. Certamente se esse vinho tivesse sido consumido há dois anos, a impressão teria sido outra. Me pareceu evoluído demais.
Pêra-Manca 2001 – Esse foi o pior da noite de forma unânime. Todos esperavam, no mínimo, mais corpo para um Pêra-Manca. Também faltou mais complexidade. O vinho destoou de todos os outros. A explicação veio do próprio Presidente da ABS-Brasília, Antonio Duarte, que concordou com a percepção geral: “2001 foi um ano muito fresco em Portugal, o que fez a uva amadurecer de forma diferente. O fato afetou a qualidade do vinho”, explicou.
Pêra-Manca 2003 – Com o lançamento da colheita de 2003, a imagem tradicional e colorida do rótulo do Pêra-Manca foi alterada (confesso que preferia o rótulo anterior, mas enfim…). De toda forma, o vinho dessa safra foi considerado excelente pelos degustadores. Alguns o elegeram o melhor da noite. Taninos macios e boa acidez e frutas passas na boca, com ligeiros tostados. Não o considerei 100% porque ficou devendo em aromas quando comparado aos demais.
Pêra-Manca 2005 – Este sim, para mim, o melhor da noite. Aromas de ameixa preta, taninos macios acidez equilibrada, longa persistência no nariz e na boca. Um vinho perfeito. Acredito que a consultoria do renomado Michel Rolland tenha influenciado positivamente na produção deste vinho. (Esse fato inclusive é contestado por muitos que criticam o enólogo por produzir vinhos para atender à demanda global por vinhos mais frutados e prontos para serem bebidos mais jovens).
Pêra-Manca 2007 – Sem dúvida um vinho excelente, com aromas de ameixa preta, tabaco e até noz moscada. Muito persistente no nariz e na boca, mas com potencial para envelhecer um pouco mais. Considerei os taninos ainda um pouco duros (muita adstringência). Se eu tivesse uma garrafa em casa, esperaria, no mínimo, mais um ano para bebê-la e encontrar todo o potencial esperado.
Pêra-Manca 2008 – O vinho ainda estava muito fechado no aroma, mas era possível notar frutas pretas maduras e até notas de tabaco. Muito concentrado, com boa acidez e final persistente. Como o Pêra-Manca 2007, ainda com taninos muito duros. Mas, sem dúvida, um excelente vinho para ser apreciado daqui uns anos.
Vinho caro – Por não ser barato, o Pêra-Manca é um vinho para poucos. O da safra 2008, por exemplo, pode ser encontrado em algumas lojas especializadas por R$600,00. As safras anteriores já foram todas vendidas no Brasil e somente são encontradas a preços muito mais elevados (entre R$700 e R$1500,00) quando oferecidas por alguém que o guardou com esse intuito. Agora, uma boa opção para quem tiver interesse em experimentar ao menos uma tacinha da safra 2008, é procurar o Empório Santa Maria, em São Paulo. Lá o vinho é vendido em taças e 30ml da bebida sai por R$40,00. O local possui a Enomatic – uma máquina com sistema inovador de preservação a nitrogênio que permite que os vinhos sejam conservados até 30 dias depois de abertos.